Não, a autora deste artigo não errou a sigla desse importante segmento turístico, o LGBT(QIA+). A ideia foi apenas fazer uma chamada atrativa para que vocês, caros leitores, se interessem pelo tema árido que aqui será abordado: a LGPD – Lei Geral de Proteção de Dados no Turismo.
Para quem nunca ouviu falar, a LGPD, recentemente sancionada pelo Presidente da República e ainda engatinhando no país, promete revolucionar a forma como lidamos com os dados pessoais no Brasil. Ela pode significar o fim das chamadas indesejadas de telemarketing (será?!) e um maior respeito com a privacidade das pessoas. No caso de descumprimento, a previsão é de penalidades pesadas, o que deixa muitas empresas (Google, Facebook, Uber…) de cabelo em pé. Principalmente quando se lembram dos recentes escândalos de vazamento de dados de seus clientes. E, como para todos os demais setores, a LGPD significa a necessidade de mudanças no turismo.
Esta lei surge claramente com um viés econômico. Apesar de trazer uma proteção maior para os consumidores, sua principal razão de ser é a competitividade de mercado das empresas brasileiras no cenário internacional. Atualmente, mais de 120 países possuem alguma lei de proteção de dados pessoais e a mais famosa talvez seja a GDPR – General Data Protection Regulation, implantada na Europa e que inspirou a versão brasileira.
Mas, o que exatamente é a LGPD? Para começarmos a falar dela, é importante entender que apenas os dados pessoais, e não os de empresas, estão protegidos por essa Lei. Além disso, temos que considerar algumas premissas para a sua aplicação; e conhecer as situações de exceção, nas quais a LGPD não se aplica.
Em resumo, a LGPD deve ser implantada por TODAS as empresas que atuem no Brasil e lidem com dados pessoais de clientes, fornecedores, parceiros, sócios, funcionários… não importando o porte, o segmento ou o faturamento. Já para o poder público, há as exceções já citadas e a previsão de que o tratamento de dados pessoais possa ocorrer na execução de políticas públicas.
Após esse breve resumo (acreditem, tem muito mais para se conhecer sobre a LGPD!), vocês, leitores sobreviventes, devem estar se perguntando o que tudo isso significa para as empresas que atuam no turismo brasileiro. Bem, significa uma mudança estrutural no relacionamento com os turistas e, coloca em xeque estratégias baseadas na tecnologia, como os Destinos Turísticos Inteligentes.
Basicamente, nada pode ocorrer sem que os turistas manifestem seu consentimento de forma expressa. Perguntou o nome do cliente e registrou em algum sistema ou até mesmo no caderninho? Precisa do consentimento! Quer mandar um e-mail de aniversário? Precisa do consentimento do aniversariante! Preparou uma oferta especial para as férias de seu cliente e quer enviar para ele por WhatsApp? Sim, também precisa do consentimento! E, adivinhem? Os turistas/clientes podem, a qualquer instante revogar esse consentimento. Também é direito deles perguntarem, sempre que quiserem, quais dados pessoais deles a empresa possui, acessar esses dados, corrigi-los, solicitar a anonimização, a portabilidade, o bloqueio ou até mesmo a eliminação, e obter informações sobre o compartilhamento com outros entes.
Já está pensando em desistir de saber qualquer informação pessoal de seu cliente? Vai passar a chama-lo apenas de senhor ou senhora? Rasgar de vez todos os conceitos de marketing digital que duramente foram implantados na sua empresa? Calma, também não precisamos radicalizar!
A LGPD traz sim uma série de desafios para as empresas. E não há uma receita pronta para implantá-la. Tudo dependerá dos dados coletados e para quais finalidades. No caso dos hotéis, por exemplo, os dados coletados na Ficha Nacional de Registro de Hóspedes – FNRH estão na exceção de segurança pública. Contudo, os hotéis podem apenas coletar esses dados e compartilhá-los com as autoridades públicas. Eles não podem ser usados para outros fins sem o consentimento expresso dos turistas. Quer usar o e-mail informado na FNRH para enviar promoções, condições especiais ou felicitações? Basta elaborar um simples termo de consentimento que explique essas finalidades e coletar a assinatura dos hóspedes. E, se em algum dia esses hóspedes pedirem para não receber mais nada por e-mail, basta retirá-los do mailing. Você pode até mesmo aproveitar essa oportunidade e perguntar o motivo para a solicitação e, assim, tentar melhorar algum serviço ou a sua comunicação. Isso também é gestão de marketing!
Possivelmente, vocês devem estar se perguntando sobre os dados pessoais que livremente os turistas postam nas redes sociais. Será que esses podem ser usados pelas empresas de turismo? A resposta é: dificilmente! Ao se tornar um usuário de qualquer rede social, as pessoas aceitam termos de uso, muitas vezes sem ler, que explicam (ou deveriam explicar) o que será feito com seus dados. Nestes termos pode estar previsto o compartilhamento com terceiros. Assim, de forma genérica. Ou, estes terceiros podem ser nomeados e passarem a ser exclusivos. Mas, como você, que é proprietário de uma agência de viagens e não do Instagram, vai saber disso se o termo de uso não é seu? O mais seguro é que você tenha seu próprio termo e que colete o consentimento necessário para o tratamento de dados pessoais. Dessa maneira, sua empresa terá evidências de que está cumprindo a LGPD e evitará problemas que vão desde o questionamento sobre a credibilidade dela, até as pesadas multas previstas na Lei.
Em tempos de redes sociais cada vez mais presente no cotidiano, os brasileiros ganham na LGPD, mesmo sem pedir, uma aliada na proteção e no respeito a privacidade. Pode ser o início de uma nova era, na qual de fato o cidadão comum compreenda que dados são o novo petróleo para a economia. Caberá ao turismo também se adequar a esta nova tendência.