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Quando falamos de turismo LGBTI+, particularmente no contexto da comunidade, um aspecto muitas vezes subestimado é o da simpatia e da qualidade do atendimento. Além da importância óbvia em garantir uma experiência positiva para o visitante, tais aspectos contribuem com um impacto econômico significativo. Em muitos casos, podem até ser verdadeiros divisores de águas para o crescimento de uma região ou de um empreendimento. Sem jamais esquecer que a atividade turística, é atividade econômica também da hospitalidade e acolhimento.

Para ilustrar esse ponto, segundo a Organização Mundial do Turismo (OMT), em  2019, o turismo internacional gerou uma receita de 1,7 trilhão de dólares,  representando cerca de 29% das exportações de serviços e 7% das exportações  globais. No Brasil, segundo dados do Ministério do Turismo, o setor representou 8,1% do PIB em 2019.   

O turismo LGBTI+ tem uma participação significativa nesse cenário. O segmento é responsável por 10% do fluxo turístico global (dado obviamente subnotificado e já bastante desatualizado) e movimenta cerca de 218 bilhões de dólares anualmente, de acordo com a OMT. Esses números reafirmam a importância econômica desse público que, em pesquisas recentes, têm entre a geração Z, quase 30% de pessoas se identificando como LGBTI+.   Segundo a OutNow Consulting, o gasto médio do viajante LGBTI+ é de US$ 1.270 por viagem, 28% acima dos US$ 990 gastos por turistas em geral, segundo essa mesma pesquisa.

Eis aqui uma dificuldade em dados, e a importância de se incluir especificamente esse tema nos levantamentos necessários ao planejamento de políticas públicas, estratégias de negócios etc. Mais uma ferramenta de apagamento ou invisibilidade desta população quando por exemplo, o último Censo brasileiro se recusou a incluir a coleta de informações sobre a população LGBTI+ brasileira.

Onde entram a simpatia e a qualidade do atendimento no Turismo LGBTI+

Como qualquer segmento de demanda, a comunidade do Vale ou a comunidade LGBTI+, é um grupo segmentado de perfis de viajantes que perpassa todos e qualquer segmentos de oferta como turismo de aventura, religioso, cultural ou de negócios. Apenas troca-se a perspectiva focada no destino e na segmentação da oferta para uma análise focado no personagem principal desta narrativa: o turista consumidor. É como pensar no turismo, mas com foco na perspectiva das pessoas com mais de 60 anos, pessoas com deficiência, pessoas pretas, ou outras formas de segmentação como grupos de família, que inclua de preferência, também os nossos amados companheiros não humanos, como o turismo Pet Friendly.

Neste caso, o turismo LGBTI+ possui foco em toda população LGBTI+ e sua gama de diversidades afetivo-sexuais, de identidade e expressão de gênero e/ou sexo designado. E sim, isso inclui também pessoas heterossexuais. Mas isso pode ser tema para outro bate-papo. 

E onde entra a simpatia e a qualidade do atendimento nesse contexto? Um estudo de 2018 do Tripadvisor mostrou que 94% dos viajantes são mais propensos a visitar um negócio que tem avaliações positivas, destacando-se exatamente estes pontos: simpatia e qualidade do atendimento.  

Já um estudo da Universidade de Warwick no Reino Unido mostrou que o aumento na satisfação do cliente, o que está fortemente associado a um bom atendimento,  pode levar a um aumento correspondente na satisfação dos funcionários e, por  consequência, em sua qualidade de vida.

Um atendimento amigável cria uma imagem positiva para um destino turístico, atraindo mais visitantes e fomentando o crescimento econômico. Esse crescimento, por sua vez, pode ser reinvestido para melhorar a infraestrutura, os serviços e a qualidade de vida da população local.

Há exatos 10 anos – em 2013 – já tinha sido identificada a correlação entre a simpatia e a saúde dos negócios, assim como os custos diante de uma gestão pouco amigável. Resistir à diversidade de pessoas hoje é não só contraproducente, mas certamente um atestado de insignificância mercadológica a curto prazo.  

Vale lembrar que em recente decisão do STF (Supremo Tribunal Federal) reconheceu-se que ato ofensivo praticado contra pessoas da comunidade LGBTI+ é crime e pode ser enquadrado como injúria racial. A palavra racial, aliás, já não possui mais o mesmo contexto e semântica de alguns anos atrás. Estamos vivendo momentos de mudanças, e como a qualquer outra pessoa em seu tempo, nos é necessária a compreensão de que sim as coisas mudam, afinal “farmácia” já não se escreve mais com “ph”.

Para concluir, a simpatia e a qualidade de atendimento não são apenas a base para uma experiência turística positiva. Eles são também catalisadores econômicos estratégicos e potencializadores de bem-estar social. Em um mundo pós-pandêmico e de graves ressacas com efeito generalizado na saúde psicológica das pessoas, a   empatia é ainda mais valorizada, a qualidade do atendimento é chave essencial não  só para a recuperação, mas para a sobrevivência dos negócios no futuro próximo. 



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Afonso Maximino Krücken Martin

Turismólogo pela PUC-SP, Afonso é pai, bissexual, gosta de jogos de estratégia, livros de história e filmes heroicos. Gosta de fazer perguntas e de uma boa conversa sobre a vida. Com passagem profissional na iniciativa privada, administração pública, e no terceiro setor. Como profissional e posteriormente como empresário, atuou no mercado varejista e em diferentes setores da economia criativa. Hoje está consultor e Diretor Executivo na Câmara de Comércio e Turismo LGBT do Brasil. Sobre o Turismo Spot: "Aquela roda de conversa entre gente incrível, que pensa e vive o turismo como forma de desenvolvimento crítico e mais sustentável. Sabe aquela história de ver mais longe sobre os ombros de gigantes? Aqui sentamos todos a mesma mesa, e também por isso vamos mais longe."