Um panorama da visitação em parques brasileiros
O Instituto Semeia lançou um estudo com dados sobre a visitação em unidades de conservação (UCs) brasileiras. Denominado “Visitômetro dos Parques do Brasil: dados, desafios e boas práticas do monitoramento da visitação”, a publicação apresenta, dentre outros aspectos, o panorama da visitação em parques nacionais e estaduais. Os dados demonstram um aumento progressivo do número de visitantes desde 2012, mas escancara também o gap entre o imenso potencial e a efetiva visitação a parques naturais do Brasil. Vamos aos dados!
O cenário atual das Unidades de Conservação brasileiras
O estudo, que apresenta informações de 2023, avaliou números da visitação de 308 parques nacionais ou estaduais. Destes, apenas 165 apresentam algum tipo de monitoramento das visitas no mesmo ano (o que já sinaliza um alerta importante). No total, as 165 unidades receberam 15,9 milhões de visitas, sendo 11,8 milhões em parques nacionais e 4,1 milhões em parques estaduais. Se dividíssemos os visitantes igualmente entre os parques que monitoram a visitação, teríamos cerca de 96 mil visitantes por unidade/ano (o que remeteria a cerca de 8 mil visitantes/mês). Mas a realidade é que apenas 3 parques nacionais – Tijuca (RJ), Iguaçu (PR) e Jericoacoara (CE) – concentram 49% do total de visitantes. Além disso, a soma dos 150 parques com menor fluxo de visitantes não atinge o número de visitas registrado apenas no Parque Nacional da Tijuca, que recebeu o maior número de visitas (4.464.257 visitantes).
Muito se fala sobre o potencial do Brasil para o turismo de natureza. Há 10 anos atrás, o Brasil já era avaliado como o melhor posicionado na dimensão de “recursos naturais” do Travel and Tourism Competitiveness Index, realizado pelo Fórum Econômico Mundial (no estudo de 2024, o Brasil aparece na 5ª posição nessa mesma dimensão). Em 2023, o Brasil conquistou o 1º lugar no Ecotourism Index: The Best Holiday Destinations For Nature Lovers, realizado pela a Revista Forbes.
Principais desafios do turismo nos parques naturais
É fato que a quantidade de áreas protegidas e a biodiversidade do país são os grandes responsáveis por essas avaliações positivas. E, claro, as unidades de conservação possuem um papel central para a performance do Brasil. Mas, ainda que todo o potencial seja reconhecido, por que o Brasil ainda apresenta dados de visitação tão pequenos em unidades de conservação? A resposta a esse questionamento é complexa e certamente passa por diferentes fatores econômicos, estruturais, políticos, sociais e ambientais. Mas me arrisco aqui a compartilhar algumas reflexões sobre 3 aspectos que podem ser trabalhados para mudar essa realidade:
1.Gestão da visitação turística, estrutura e atividades turísticas:
Em geral, os parques nacionais e estaduais são áreas extensas e que carecem de recursos financeiros e humanos para garantir sua gestão básica. Isso inclui:
- o monitoramento das atividades realizadas em acordo com a legislação ambiental e com os objetivos de conservação;
- o monitoramento da fauna e da flora;
- a fiscalização do uso da área e de invasões; a gestão de conflitos;
- o monitoramento de incêndios;
- o relacionamento com o entorno, etc.
E o turismo é uma atividade complexa, que demanda outras habilidades para sua gestão, acompanhamento, monitoramento e fiscalização. O que gera ainda mais demanda para as unidades, já tão carentes de orçamento e pessoal.
Para se ter uma ideia, das 308 unidades de conservação pesquisadas pelo Instituto Semeia, apenas 165 fazem o básico em relação à gestão do uso público, que é o monitoramento da visitação. Poucas unidades possuem estruturas de apoio ao visitante (centro de visitantes, banheiros, sinalização etc) e oferta de serviços (guias, lanchonetes, passeios, experiências etc), o que torna, muitas vezes, a visitação desafiadora.
2.Priorização do turismo em Unidades de Conservação em políticas públicas:
As UCs são bens públicos e são geridas por órgãos da administração pública federal, estadual ou municipal. O intuito central das unidades, como não podia ser diferente, é a conservação. O turismo é uma poderosa ferramenta de desenvolvimento sustentável e pode ser um aliado da conservação, mas falta uma priorização e incentivo claro ao desenvolvimento da atividade nas UCs e a criação de condições para que o ela aconteça (em termos, principalmente, de orçamento e alocação de pessoal). Recentemente, a Câmara dos Deputados aprovou um projeto de lei, de autoria do Deputado Federal Túlio Gadêlha (REDE/PE), que institui a Política Nacional de Incentivo à Visitação a Unidades de Conservação.
A proposta, que ainda precisa passar por aprovação do Senado, dispõe sobre a visitação a unidades de conservação e autoriza o Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio) e os órgãos estaduais e municipais executores do Sistema Nacional de Unidades de Conservação (SNUC) a contratar instituição financeira oficial para criar e gerir fundo privado com o objetivo de financiar e apoiar a visitação a unidades de conservação. O projeto de lei propõe também a criação de um o Fundo de Incentivo à Visitação a Unidades de Conservação. Sem dúvidas, iniciativas como essa são necessárias para alavancar e concretizar o potencial turístico reconhecido das áreas protegidas brasileiras.
3.Comunicação e promoção:
Fazer turismo no Brasil não é simples e demanda bastante pesquisa e empenho. Faltam informações completas sobre acesso, meios de transporte, atividades, estruturas de suporte. Nas unidades de conservação, essa dificuldade se acentua: poucos locais informam com clareza quais atividades o visitante pode realizar, como combiná-las em um mesmo dia, qual o nível de dificuldade envolvido e que tipos de serviços estão disponíveis tanto na unidade quanto no entorno. Mais raro ainda é o entendimento claro do público potencial e uma estratégia de promoção direcionada. Nesse aspecto, há um mar de possibilidades pouco ou nada exploradas.
Já é passada a hora de deixarmos de ser reconhecidos pelo nosso potencial diante de tantas oportunidades. A conjugação desses esforços pode transformar o turismo em parques naturais em uma realidade vibrante no Brasil e uma força motriz de um futuro sustentável, que gere muito mais desenvolvimento e conservação!