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A vanguarda de Minas Gerais na política de regionalização é notória e conhecida no pais. Mas apesar de estratégias bem-sucedidas, há grandes desafios a serem vencidos. Trata-se, portanto, de uma política em construção.

Destaca-se que Minas Gerais em 1999¹, com a da criação da Secretaria de Estado de Turismo – SETUR por Manoel Costa, então secretário de estado de planejamento, geriu trabalhos para o fomento dos chamados circuitos turísticos² (atualmente Instância de Governança Regional- IGRs). No entanto, algumas regiões já se organizavam de forma aglutinada para soluções conjuntas no setor em formato de associação em 1998. Esse modelo, junto com o modelo francês, serviu como inspiração para a então SETUR- MG expandir um movimento orquestrado pelo estado na formação destas entidades. Com a publicação do Decreto 43.321 de 08/05/2003, os Circuitos Turísticos têm seu “nascimento oficial”, dando a primeira diretriz para esta política no estado.

A incipiente compreensão da sociedade, e sobretudo dos setores públicos, sobre importância econômica, social e ambiental do turístico, que gera (não só) receitas e empregos, e a capacidade das políticas públicas de orientar as ações e decisões para o desenvolvimento do setor afeta as políticas de turismo bem como a de regionalização.  Atualmente essa política tem como foco o aprimoramento gestão pública de turismo, responsável por diversos avanços do estado em termo de ferramentas de gestão municipal, conforme o Censo do Turismo da própria secretaria aponta e a comparação destes dados com a de outros estados pelo Ministério do Turismo. Também fomentou ferramentas de gestão regional, fóruns de discussão nas regiões e entre elas, ações regionais, e procedimentos de registros e fluxo de informações, por exemplo. Além do resultado principal: fomentou a organização do turismo em regiões pouco conhecidas do estado, interiorizando o turismo.

Desafios da intersetorialidade na vanguarda mineira.

A intersetorialidade da própria gestão pública, que tem como objetivo promover o bem da coletividade de forma integrada, ainda é um desafio à regionalização. É posto que o patrimônio natural e o cultural de uma localidade apresentam questões congruentes com o turismo, mas essa discussão vai além e inclui muitos setores e profissionais de suas áreas, entre elas contábil e jurídica.

Conhecida como Marco Regulatório das Organizações da Sociedade Civil, a LEI 13.019/2014 e sua forma de implementação, trouxe desafios, e, inicialmente, até mesmo impedimentos para a continuidade da política. A vanguarda mineira trouxe uma situação não compartilhada com a federação ou com outros estados que ainda não sofriam as consequências das mudanças proposta nesta lei, e uma incerteza jurídica que ainda hoje é temática de constante sensibilização de jurídicos e contabilidades que desconhecem a importância social do setor, mesmo o assunto já pacificado na compreensão de juristas e contadores da maioria dos municípios.

Política Estadual X Federal

A compreensão e a interseção da política estadual e federal também se apresentam como questões que muitas vezes não ficam evidentes para gestores públicos. Em ambas, há uma dificuldade de se identificar os resultados de forma objetivas e monitora-los. O que contribui para uma fragilidade de apropriação da política pelos participantes. O “Mapa do Turismo Brasileiro” e a regionalização em Minas Gerais embora sejam ações que dialogam são independentes e possuem características, critérios, territórios e tempo de amadurecimentos distintos.

Como a política em MG tem maior tempo de continuidade prática possui já papéis mais definidos, critérios próprios, maior foco em ações regionais, um processo de certificação e validação de critérios independentes. Por outro lado, o programa federal, que atualmente conta como principal resultado o Mapa do Turismo Brasileiro e a Categorização dos Municípios, passa por constantes discussões em termos de critérios, tem como desafio os diferentes patamares de desenvolvimento da política em cada Estado e suas autonomias administrativas e, dentre todos, um gargalo jurídico e técnico que coloca no centro o foco em ações municipais, muitas vezes dissociadas de resultados regionais. Em termos práticos e esclarecendo, em especial para gestores municipais do estado mineiro, atualmente estar na política estadual é uma etapa e não significa automaticamente estar na política federal.

Ampliar o diálogo

A política de regionalização estimula a governança pelo trabalho conjunto do tripé de entidades públicas, privadas e do terceiro setor. Houve grande avanço na política estadual em relação aos procedimentos e diálogos com o setor público, mas a iniciativa privada, apesar de reconhecerem a importância, a sua inserção política de regionalização ainda é muito restrita.

Durante o período da pandemia, enquanto o setor sofreu com inúmeros prejuízos evidenciou-se a necessidade de uma estratégia de aproximação da política com a iniciativa privada e o terceiro setor. Não somente para identificar na cadeia produtiva os gargalos, mas também para estimulá–los na implementação de um turismo mais sustentável, como os conceitos de ESG (Environmental Social and Governance). Aprimorar a estratégia de comunicação passa também por novos dados de mensuração do setor, por exemplo, hoje se monitora o número de empregos gerados ou recuperados, porém pouco se discute sobre a qualidade de emprego e condições dos trabalhos. Por outro lado, observa-se uma tendência à pequenos produtores e para o slow turismo o que agrega ao desenvolvimento proposto na regionalização. O desafio permanece em como estabelecer diálogo com o avanço na participação local e consolidação das redes turísticas, em um cenário de grande diversidade das realidades dos municípios mineiros.

Profissionalismo

Dentre as dificuldades enfrentadas na política está a crença que todo município é um destino turístico com fluxo de pessoas expressivo, e, em especial, que participar de uma Instância de Governança Regional é o suficiente para se posicionar no mercado tal qual destinos de oferta principal. Parte dessa problemática tem vários fatores, dentre: incipiente entendimento e dificuldade de dados monitoráveis da cadeia produtiva do turismo; foco em resultados rápidos que ignoram etapas importantes de uma implementação de planos e projetos com metas monitoráveis; e foco em mercados externos sem trabalhar mercados regionais.

Em relação às ações de marketing de destinos e a regionalização percebe-se um grande estímulo para a promoção em detrimento do fortalecimento do produto que estimule um desenvolvimento local e maior avanço na participação e mobilização da cadeia produtiva. Conceitos como destinos de oferta principal, complementar e de apoio à oferta turística e a mensuração do benefício na participação de municípios em uma IGR, ainda são assuntos que precisam ser reafirmados. Embora nivelar conceitos e o fluxo na cadeia produtiva sejam uma importante etapa de desenvolvimento e comercialização de produtos turísticos, em muitos casos, antecipa-se para a etapa de promoção. A política de regionalização tem ainda muito a agregar nesta lógica, uma vez que pode ser o elo desta cadeia produtiva agregada ao desenvolvimento de produtos e ampliando o desenvolvimento local pelo turismo.

Em linhas gerais, avaliando os pontos em que a política avançou e os desafios, há uma convergência para uma questão: profissionalismo, uma vez que, o estímulo para o desenvolvimento local pelo turismo, passa pela ampliação dos conhecimentos específicos dos atores da cadeia produtiva sendo importante a inserção de profissionais capacitados no setor. Outra questão trata-se da continuidade de políticas, afinal a regionalização também foi consolidada pela sua continuidade acompanhada a adaptações e mudança conforme o cenário inserido.

¹   Em 23/10/1999, por meio da Lei Estadual 13.341/99, governo Itamar Franco.

² Entre 2000 e 2002, antes desse movimento orquestrado pelo órgão onde houve a realização de

oficinas pelo estado e resultou na formação de 47 Circuitos em 2003.

AZEVEDO, Geiza. Política de regionalização do turismo de Minas Gerais: uma análise sob a percepção de agentes do poder público municipal. Fundação João Pinheiro: Belo Horizonte, 2015.

RIBEIRO, Fernando Gomes. Circuitos Turísticos mineiros: coerência e contraditoriedade na manutenção da política de turismo. Fundação João Pinheiro: Belo Horizonte, 2011.

TRINDADE, Rubens. Circuitos Turísticos Mineiros: Descentralização, autonomia e gestão em relação ao turismo de base local. Universidade de Brasília. Brasília, 2009.

SECULT. Censo do turismo. Observatório do turismo de Minas Gerais. Disponível em (https://www.observatorioturismo.mg.gov.br/?s=censo) . Acesso em 13/04/2022.

MINISTÉRIO DO TURISMO. Regionalização do Turismo. Regionalização. Disponível em (http://www.regionalizacao.turismo.gov.br/index.php?option=com_content&view=article&id=77&Itemid=107 ) .Acesso em 14/04/2022.

 

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Flavia Ribeiro

Uma mulher em constante (des)construção que ama carnaval e o turismo, seja a lazer ou profissionalmente. Acredita no turismo como transformação social. Um mundo melhor construímos a cada dia fazendo o que é possível na realidade de cada um. Formada em turismo pela UFMG, pós em gerenciamentos de Projetos, mobilizadora de processos participativos e aspirante a curandeira. Sobre o Turismo Spot: É um espaço com informações de qualidade, linguagem mais acessível e assuntos contemporâneos. Um presente generoso que esta equipe disponibiliza ao setor.